Mulheres na arte: onde elas estão?
Neste Dia Internacional da Mulher, destacamos a história das mulheres na arte. Afinal, temos uma lacuna na história - as mulheres sempre estiveram por aqui produzindo, mas tiveram seus trabalhos inferiorizados ou esquecidos. Por isso, vamos falar sobre o tema e, de quebra, indicar 4 artistas latino-americanas que você precisa conhecer!
Qual a participação das mulheres na arte?
Não faltam mulheres nas universidades, sobretudo nos departamentos de belas artes. No entanto, em pesquisa da plataforma Artnet, mulheres representam apenas 2% no mercado de arte. Isso diz respeito a participação de mulheres em exposições em galerias, acervos de museus e colecionadores.
Além disso, as mulheres são a maioria dos profissionais dos museus, mas ainda sim não estão nos cargos de liderança. Esse dado nos mostra que não importa a diversidade nas universidades ou no mercado de trabalho, o lugar que faltam mulheres - cis, trans, negras - são na tomada de decisões das instituições. Afinal, quem escolhe quem pode expor no museu está num local de poder.
É fato que numa sociedade machista, os colecionadores dão preferência a obras feitas por homens, pois julgam que aquele trabalho tem mais qualidade. Tal dinâmica faz com que esses trabalhos sejam mais disputados e que sejam vendidos a valores mais altos. É isso que ocorre dentro das bolhas de luxo do mercado de arte, onde quem paga mais por obras feitas por homens são eles mesmos: os homens.
Como surgiram as mulheres na arte?
A produção das mulheres na arte é plural e diferencia-se em cada contexto e local do mundo. Ou seja, não existe um único surgimento deste grupo na arte. Entretanto, na História da Arte da Europa, o século XIX é um dos momentos relevantes para trazer luz à diferença entre homens e mulheres.
Nesse período, como aponta a historiadora Tamar Garb (1999), a maioria das mulheres burguesas estavam em casa, responsáveis pelo lar e pelos filhos. Eram incentivadas a praticar arte como hobbie: a gravura, o bordado, a costura e as ilustrações botânicas eram perfeitas para a “natureza sedentária e temperamento paciente” característico da mulher, segundo a visão da sociedade na época.
Enquanto os homens entravam na formação acadêmica de arte e ocupavam o espaço público tendo a arte como profissão, para as mulheres restavam as práticas conhecidas como “artes secundárias” e a produção artística de forma amadora.
Qual a importância das mulheres na história da arte?
Sem dúvida, resgatar a história das mulheres é agir para diminuir as desigualdades sociais nesse sistema.
Se as mulheres abriram portas de forma autodidata, isso só nos mostra a criatividade e o potencial de seus trabalhos. A verdade é que elas não ficam atrás de homem algum, mesmo que tudo conspire para isso.
Essa representatividade traz um olhar para além dos corpos brancos e cisgêneros apresentados no discurso oficial da história da arte. Assim, é criada uma riqueza de linguagens artísticas, culturas e histórias. Ter espaço para criar arte e, consequentemente, imagens e discursos também é um local de poder.
Como a mulher é retratada na arte?
Ao longo da história, as mulheres retrataram sua própria imagem de maneira diversa. Desenhar ou pintar a si mesma ou outros corpos foi uma prática comum. Frida Kahlo, importante pintora mexicana, foi um exemplo dessa auto representação. Através do surrealismo, a artista pintou sobre sua história. Como o grave acidente que sofreu aos 15 anos, bem como sua sexualidade, dores e desejos.
Já os homens, de maneira geral, retrataram o corpo feminino nu explorando os ideais de belo, entre outros signos de pureza e sexualidade. Não à toa, o grupo de ativistas anônimas Guerrilla Girls (1985) denunciou a quantidade de nus femininos nos acervos de museus mundo afora. O questionamento mais famoso do grupo é se as mulheres tinham de estar nuas para entrarem no museu. Ou seja, isso nos mostra como as mulheres foram inferiorizadas à "musas" como meros objetos e não como sujeitos.
[caption id="attachment_146628" align="aligncenter" width="372"] Venus of Urbino Ticiano (1538). Reprodução: Google Arts & Culture.[/caption]Mulheres negras na arte
O papel da mulher negra nas artes visuais é característico, pois é afetado pelo racismo. Dentro dessa dinâmica, são criados estereótipos que influenciam nosso gosto e noções de beleza.
Uma artista brasileira que desafia esses estigmas é Rosana Paulino (1967). Famosa pelo conceito de “suturas”, ela bordou linhas pelo corpo da mulher negra escravizada, representando o corpo feminino pela ótica da colonização. Fez isso através do bordado em bastidor, fotografia e colagens.
[caption id="attachment_146629" align="aligncenter" width="300"] Rosana Paulino, obra "Assentamento" (2013). Reprodução: EL PAÍS.[/caption]Sob o mesmo ponto de vista, mas numa linguagem totalmente diferente, temos como exemplo Faith Ringgold (1930). A pintora estadunidense trouxe na colcha de retalhos narrativas sobre ser mulher e negra. Além disso, trabalhou com temas como direitos civis dos anos 60 e sua história no bairro do Harlem, Nova Iorque.
Mulheres brasileiras na arte
Se observamos um contexto global que apagou a presença da mulher na arte, no Brasil não foi diferente. Como nos conta a pesquisadora Luciana Gruppelli (2008), a história das mulheres é uma “história de ausências”. Dessa forma, a falta de registro histórico fez com que muitos nomes ficassem para trás.
Ainda sim, tivemos - e temos - artistas incríveis e relevantes no país. Como é o caso de Márcia X (1959-2005), que fazia performances e ressignificava objetos. Em suas obras, ela utilizava uma linguagem sarcástica e brincava com signos religiosos, questionando moralismos sociais.
[caption id="attachment_146630" align="aligncenter" width="362"] Marcia X. "Desenhando com os terços" (2000). Reprodução: Marcia X[/caption]Além disso, muitas outras mulheres poderiam ser citadas. Como Maria Martins (1894-1973), Lygia Clark (1920-1988), Lygia Pape (1927-2004) ou Maria Auxiliadora (1935-1974). Ou mesmo as contemporâneas como Beatriz Milhazes (1960) e Adriana Varejão (1964).
Mulheres que participaram da Semana da Arte Moderna
A Semana de Arte Moderna de 1922 foi um evento importante na história brasileira, pois contou com artistas, poetas e escritores apresentando o movimento modernista. Nesse contexto, a artista Anita Malfatti (1889-1664) tem protagonismo, pois trouxe muitas referências estrangeiras que foram fonte para as experimentações que os artistas faziam no período. Não à toa, ela teve sua primeira exposição individual em 1917 após ter estudado fora do país.
Apesar da relevância de Anita Malfatti para o modernismo brasileiro, outras artistas da época acabaram sendo esquecidas. Como por exemplo Tereza Aita (1900-1967), artista plástica que teve relevância na semana de 22 em Minas Gerais. A artista desenhava, era pintora e também ceramista. Mas a cerâmica sempre foi taxada de “arte decorativa”, o que pode explicar o apagamento de seu trabalho, conforme apontou especialista para artigo na BBC.
4 artistas mulheres latino-americanas para conhecer e se inspirar
Cecilia Vicuña (1948)
Artista visual, poeta, cineasta e ativista feminista
Cecilia Vicuña é chilena e sua trajetória é marcada por resistência, já que a artista nasceu e cresceu durante a ditadura de Pinochet no Chile. Em suas obras, vemos temas como memória, inquietações sociais, natureza e exílio.
Emma Segura (1994)
Artista visual transfeminista
Emma Segura é costa-riquenha e seus trabalhos giram em torno da performance, arte têxtil, ilustração e escultura. Para a artista, os têxteis representam uma resistência como mulher trans. Nesse sentido, ao utilizar os materiais de tecido ela cria narrativas que se opõem à opressões de gênero.
Valerie Brathwaite (1940)
Artista e escultora
Valerie Brathwaite é venezuelana e reconhecida no país desde a década de 70. Através de materiais como cerâmica, bronze, cimento e materiais têxteis esculpiu formas orgânicas e expansivas. Conforme relatos da artista, as esculturas remetem aos corpos femininos e a relevos da natureza.
Wilma Maynas Inuma (1964)
Artista têxtil, ceramista e pintora
Wilma Maynas Inuma é artista tecelã de Shipibo, moradora da comunidade de Cantagallo, Lima, Peru. Seu trabalho artístico representa o sistema de design dos povos Shipibo-Konibo da Amazônia peruana. Como materiais, utiliza corantes naturais, fios de lã coloridos e algodão, entre outros. Dessa forma, seu trabalho reforça a tradição dos povos indígenas e também é um símbolo de resistência.